A DERIVA POPULISTA, MOURINHO E O BENFICA
A chegada de Mourinho ao Benfica e a extraordinária mobilização nas eleições do clube, com quase 94.000 votantes, abalaram o ecossistema do futebol nacional.
" Mourinho está a fritar os jogadores (...) e o Benfica não
joga nada"; " Com Mourinho nenhum jogador evoluiu e alguns até
pioraram", são apenas dois exemplos dos dislates diariamente proferidos
por comentadores desportivos em canais de televisão, em geral numa atmosfera
teatral de excitação e despique.
A deriva populista, na sua sôfrega busca de audiências, pretende
captar a atenção de todos os descontentes com os resultados do Benfica (somos
muitos), trazendo, dia após dia, uma nova polémica ou golpe de efeito. A
estratégia comercial é óbvia, criar uma espiral infinita de emoções negativas,
à volta de Mourinho e do clube, destinada a perenizar a atenção dos
insatisfeitos e a saturar a cena mediática deste segmento.
Como bons populistas, uma prioridade é atacar a
"elite". Ora o mais emblemático treinador em Portugal, não será um
qualquer talentoso treinador principiante, mas sim uma das figuras dominantes
do futebol internacional dos últimos 25 anos, como Mourinho. Por um lado, a
demolição verbal de Mou serve, narcisisticamente, para fazer passar o
comentador, habitualmente uma figura secundária, para a efémera posição de ator
principal do dia. Por outro lado, esta errónea propagação de desrespeito,
censura e reprovação a Mou, serve de instrumento de ataque ao Benfica e a Rui
Costa.
Efetivamente, as ambições de audiências dos novos populistas,
necessitam de uma vasta audiência-alvo, que só o Benfica pode proporcionar. As
investidas contra Mou e os ataques ao Benfica- " Mourinho está a mandar um
recado para a estrutura? Não fala com Mário Branco e Rui
Costa?"-configuram uma despudorada estratégia de mercado, despreocupada
com a exatidão dos factos e centrada na intensidade polémica da narrativa.
A atual informação desportiva, empacotada como entretenimento, e
com os comentadores plenamente auto-satisfeitos no seu papel de
"showmen", valoriza o extremismo e o absurdo, por contraste com a
função crítica explicativa e pedagógica, desempenhada por gerações de
jornalistas e comentadores desportivos no passado.
O desrespeito de notáveis figuras do país e a indireta afronta a
uma grande instituição como o Benfica, contrastam com a tradicional
contribuição do "fair-play" no desporto, para os valores cívicos da
vida em sociedade. Ser indiferentes a isto hoje, no futebol, seria uma passagem
para aceitar, amanhã, uma sociedade democrática claudicada.
Nuno Paiva Brandão
Sócio
nº 50.166